segunda-feira, 28 de setembro de 2015

Amor humano

Tenho visto depositadas nas mídias sociais milhares de histórias de barbáries e atrocidades cometidas pelos seres humanos contra seu igual. Tais eventos causam-me, e sei que no leitor também, uma repulsa imensurável, uma náusea extasiante em saber que um ser, igual a mim, é capaz de  tamanha maldade. E, reitero, uma lacuna de dor profunda quando vejo que estamos disseminando notícias assim. Por isso, como gosto de ir “ contra a maré”, na linha contrária ( graças a Deus) quero preencher meus textos com a belezura da humanidade, claro, sem nenhuma alienação.
E não há nada mais encantador que falar do amor supremo. Não simplesmente amor carnalizado, mas do sentimento que mobiliza a humanidade  continuar existindo e, mais ainda, resistindo. O amor que move nosso olhar para o mundo, que nos mobiliza em ser cordial com o outro, que promove nossa produção no trabalho, que nos faz querer rir com os amigos e desejar muito voltar para  casa. Falo do amor que faz nos aproximar de Deus e querer sempre agradecer, reverenciando a fenomenal beleza de sua criação.
 Os gregos abordam o amor ágape, o qual se refere ao amor supremo divino, mas também a nossa capacidade em praticar, em partículas, e em nossas imperfeições, com a família e demais grupos com afinidades. Ainda, tem-se o amor philia, a afeição entre amigos e o eros, referente ao amor carnal e romântico. Todas estas formas revelam nossa capacidade irresistível de amar e querer ser amado para que consigamos não só respirar como também delirar em nossas conquistas e viver o gozo da vida.
Já poetizava Adélia que o amor, de verdade, não cria ilusão e sim esperança       ( Amor feinho). E é desse amor que precisamos e muitos de nós agonizam para isso. Nós precisamos do amor divino e do humano. Nossos corpos e alma têm fome disso; grita diariamente. Somos carne, osso e amor. Não há universo científico, não há hemisférios galáxios e vertentes filosóficas sem adentrar as facetas do amor; de um amor que se encanta com um achado, que se desgoverna com um pensamento e reflexão e se amplia, com um amor que é estendido na mão calejada e sofrida, no sentimento que se borda, lindamente, na solidariedade, na ajuda ao dividir o peso das bolsas, dos sonhos e dos dilemas. Na sempre tentativa de tornar o outro mais humano.

A nossa busca pela plenitude se dá pelo amor. Se nos reinventamos é porque construímos o amor na esperança e sua nunca morte. Esperamos o amor de nossos sonhos porque selamos em nós o sentimento. A emoção de  escolher o bem , de querer construir-se  como homem de estirpe humana, que vê no outro o seu reflexo. O amor  capaz de inundar a vida e agraciar-nos com a felicidade em sermos humanos.   

* Texto publicado no Jornal Espírito Santo de Fato ( 27/09/2015)     

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

EPITÁFIO
Tenho visto que os sujeitos têm se nivelado por baixo; comido o que tem sobrado das mesas e sem nenhuma cara de poucos amigos têm deixado os corpos, leves, serem conduzidos pelas marés. É gente conformada demais ou acertando na  máscara para conviver com os efeitos nocivos, os gostos amargos e gente maquiavélica e chata.
Nunca estivemos tão sem cor, traçando os quadros com rabiscos ao invés de bonitos contornos. Estamos, cotidianamente, anunciando o que vendem os jornais, acatando os graves impostos, a mão sobressaltada e entregando tudo para os bandidos. Talvez, levantar da cadeira dói demais e abusar do discurso exige enfrentamento e milhares de doses de coragem.
Pergunto: “o que será de nós?” De que adianta tanta “ordem e progresso”, se, sei que concordará, estamos em baita desordem e  nenhuma forma de progresso? Mas, parece que abaixamos o corpo e nos deixamos apanhar. As sujeiras já escorreram há muito pelo tapete, sala, escritórios, tribunais, etc. O cheiro de moribundo já ganhou casas, igrejas e ministérios, palácios, etc. E aonde encontraremos material de limpeza suficiente e mão de obra  para que o serviço seja feito?
Tais reflexões me esmagam todos os dias e, embora necessite de uma resposta, não vislumbro, com eficiência, uma saída urgente e real. São covardias, mentiras, maldades e canalhices demais. As inverdades propagadas entre sangues e falácias, entre sorrisos amarelos e insanidades, entre paletós e tolerâncias. Cansei da boa educação, da ideia de que tudo voltará à normalidade, à organização. Claro, uma normalidade e planejamento inventados para que o poder podre seja assegurado e as ideologias vigorem. A manutenção de uma ordem que só causa efeito danoso, uma doença que não se consegue tratar.
Estou enfadada dessas doenças de caráter, das ciladas enraizadas e das perspectivas medíocres canalizadas em nós. Bastam as falcatruas justificadas e mentiras redesenhadas como tentativa de não esmorecer. Grito para que o mal saia das entranhas e das camadas mais profundas da pele, que escorra dos esgotos fétidos, que exploda dos buracos, que se esvaia dos cenários sociais, políticos e econômicos.

Cansada das babaquices vendidas nos comércios das falsas moralidades, das sentenças criadas para que poucos consigam se esquivar do frio e tenham conforto e lugar quentinho. Estamos necrosados, com tendência a perdas de membros, com tendência a medicamentos controlados para que consigamos dormir e acordar. Verdadeiramente, sinto que estamos estancando. 

Texto publicado no Jornal Espírito Santo de Fato ( 13/09/2015)

sábado, 12 de setembro de 2015



Sangues e vulcões

Sempre vi as coisas pelo avesso.  Nunca me intimidei com os incômodos e com os objetos fora do lugar. Consegui, todas às vezes, tirar coelhos da cartola e cartas da manga. Descer despenhadeiros era de praxe, como coletar agulhas em palheiros. E para conseguir um pouco de ar frente ao caos, recorria aos meus livros de cabeceira e da estante também.
Neles, ora sim ora não, encontrava mãos que me afagavam, cortes nas mãos e obscuros pretensiosos. A literatura  demonstrava ser capaz de me dar escape e um pouco de desordem, só para garantir. E nela inventava ser coisas e seres que eu era mesma, mas minha”cotiadianisse” não deixava experimentar. Se estava despencando, lá ia eu aos prantos para os livros, se tivesse conseguido bonificação em alguma esfera da vida, também batia a porta na casa dos versos, as gargalhadas, para entregar minha alegria.
Construí, nesses episódios, meu caso, sem divórcio, com a poesia. Noites e dias, em dores e sucessos, ela estava lá, servindo de ninho, casulo, pai destemido, mãe que acalma, amiga que escuta. Não sei me entregar tão completamente, tão visceral, como me desnudo para os poetas, para os versos sem clausura ou escondidos entre uma palavra e outra.
Assumo também adorar escrever também. Versos escritos são remédios de sossego e de fúria . Tiro coletâneas imaginadas e devolvo na tela ou na folha umas palavras bem ditas, mal sentidas e, por muito querer, provocadas. Ainda sim, escrevo com sangue, com náuseas, com ideias mirabolantes e com e sem apegos. A poesia lida e escrita me refresca em meio ao meu calor, às minhas tardes em que o sol não se põe. E, nas noites frias, com fel, e de vertentes brisas, entrego-me aos versos condolentes, de amores passados e projetos vindouros; aos escapes que a poesia me oferece como banquete, às portas e janelas fechadas que ela mesma não deseja anunciar.

Não sei- sou ré confesso- desvincular meus sonhos, de rimas pobres e raras, da poesia. Daquela que brinca comigo, me recrimina e me dá conselhos. Em meio às feridas e doenças, cicatrizes bem postas e sorrisos amarelos, ela vem me laçar, sustentando-me com casa e comida. A poesia é meu alimento denunciado, meu pranto seco, minha fala abusada, minha agonia rasgada, meus medos rendidos, minha existência vivificada. A poesia sangra e cura o que teima nascer e morrer. É nela que me estanco e entro em erupção.



Texto publicado na Revista Cachoeiro Cult, ano IX, n°53, agosto de 2015

                  


quarta-feira, 2 de setembro de 2015



Tenho estado em constante ensimesmamento. Nem sei a presença de tal palavra no dicionário, mas tenho estado assim.Às vezes, mesmo em multidão, encontro- me escorregadia, como visgo que tende a escorrer. Não vejo a solidão como ato de desordem ou de decadência, porém, como prova de vivência, de reversos de pensamentos. Estar só é viver completamente você, renegando hemisférios e inventando outros, com os quais poderei testar meus complexos de humanidade. A solidão não me provoca medo nem desesperança, não retira meus alicerces nem tão pouco meu vigor. Mesmo me desmanchando, me liquidificando, sinto- me em estado sólido, em completa resiliência. Resistir para existir, faço como minha máxima de cabeceira, que continuamente me visita quando me pego em total ausência dos outros. E para que sintamos nossa presença, é necessário que outros estejam ausentes, em um esplêndido esvaziar para se preencher. Ensimesmada e cheia de mim, construo, na minha solidão, uma humanidade forte, bonita e enriquecedora. Aprender ser sozinha é preciso para estar entre as outras gentes.
( Carregando- me de si...e escrevendo... converto dilemas em palavras)