sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Presente de Natal
Vivemos épocas de festas. Festas que deveriam cobrir nossas almas de sentimentos de agradecimentos e reflexões. Uma festa de reunião, esperanças e gratidões. Todavia, vejo faltarem o renascimento e a reinvenção do afeto. Fico bastante apreensiva e abismada com as criações de felicidade inventadas pelo dinheiro e seus odores de consumo.
Sinto que acabamos mergulhando em águas rasas de deveres de compras, de sorrisos irreais e de uma pseudo forma de agrado. Vemos pernas e braços abastados de sacolas cheios de produtos e objetos, compondo passos e espaços a fim de que nada- ou quase- falte para o momento natalino. Embora os braços lotados e as pernas apressadas, sinto que faltam  muitos caminhos para percorrer, sinto que as sacolas camuflam vazios e ausências que continuam pernoitando em muitos de nós.
Há conversas na cidade, barulho de buzinas, gentes estressadas. Uma corrida para um objetivo não alimentado por presentes. Isso me faz rememorar caminhos bíblicos, os quais nos deixam bem claro que não precisa palácio se existe a manjedoura. O Rei refutou a riqueza e preferiu se cobrir de simplicidade e, mais tarde, de sabedoria. E o que aconteceu conosco?
Esquecemos-nos da sabedoria e nos cobrimos de prestações e de gastos para que acreditemos na superficialidade, no desejo e nos afetos comprados, como se só vivêssemos a experiência do Natal com um sorriso criado, um presente comprado pelo vil metal e muita comida, a ponto de comermos mais do que realmente”cabe na barriga”.
Percebo que lamentamos pela frieza humana, pelas grosserias, pelas banalidades e barbáries, mas achamos que podemos comprar esperanças e renovações em uma volta pelo shopping e pelos embates da rua lotada de seres que também viraram a página dos significados da data próxima. Às vezes, sinto-me tosca por também me aproximar desta sensação do consumo, que, por ora, ameniza nossos desamparos e nossas frustrações, mas traz à tona o “monstro adormecido”: aquilo que não conseguimos afastar, aquilo que nos calcifica e nos torna menores.
Sem dúvida, o Natal ficou como coadjuvante. Compramos pacotes, embrulhos, porém, sonhos, aconchego, afeto são artigos de luxo, sem chance de promoções ou parcelas nos cartões de crédito. Fé, família, felicidade são preciosidades jamais encontradas em anúncios de TV ou em publicidade de internet. Humanidade, amor, solidariedade não estão em vitrines nem tão poucos nas sacolas carregadas.
E isso não pode ser renunciado. Não se podem negociar afagos e palavras benditas por aquele vestido ou quem sabe por aquele objeto tão querido porque foi mostrado em um canal de compras. Dessa forma, a humanidade se barateia, se coloca na superfície de tantas profundidades que ainda potencializam em nós. Nesses desenhos de consumismos, iludimo-nos e “despoetizamos” os sentimentos advindos nesta época. Deixamos vencer a aspereza, a insensibilidade e morremos um pouco mais.
O homem precioso, neste contexto, não renasce, não floresce, como uma planta que tentamos enraizar e, por mais que tentemos, não vinga,  como já dizia minha amada mãe. E, se continuarmos acreditar que o cansaço das compras, o desgaste das idas e vindas nos comércios são as atitudes mais indispensáveis, é sinal  que já nos vendemos há muito tempo e não teremos tempo para as singelezas de um tempo tão bonito. Um tempo marcado pela manjedoura, pela estrebaria, pelo choro de uma criança nascida em Belém, pela riqueza imensurável de um Rei.
Sejamos, então, anunciadores e precursores de um Natal diário, no qual haja agradecimento, simplicidade, paz, harmonia, justiça e alimentos de esperança. Sejamos nós o Natal que aproxima as pessoas pelo afeto, pelo toque, pelo sorriso, não pelas compras nem sempre necessárias e que encarecem ainda mais nosso desejo de um cenário iluminado pela alegria de um mundo melhor e não, simplesmente, pelos enfeites natalinos que clareiam as noites de nossa cidade.

 

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Arame Farpado
Sempre me percebi espreitando as coisas. Nunca consegui me enquadrar em sistemas, mas não acho danação ser assim.  Constantemente, me vejo às margens, na beira mesmo, tentando dali observar meus espaços por outro lado. Identifico-me com Drummond e me desenho “gauche” na vida, nas estradas que construo e mesmo derrubo, nas pontes e vielas que refaço pra mim. Não me vejo enquadrada nos discursos e nos ecos impostos pelos outros. Vago, sorrateiramente, entre desníveis e nas impossibilidades e, ali, reinvento minha não existente forma de ser feliz .
Mastigo novos desejos e ordens que não sentencio, invado cenários não feitos para mim e consigo dissimular receios e medos que se misturam nas minhas vestes de humanidade. Vagueio nas beiras de caminho e não recrimino outras verdades. Nem procuro me moldar nos potes e rótulos que inventaram e acharam que me coubessem. Não sou sólida, deslizo demais e desconsidero ser uma mesma mulher todos os dias.
Gosto de experimentos, de sentimentos inaugurados em meu corpo e novos braços e pernas. Espero beijos mesmo sem perdões e sei que sou desajustada, carente de muitas coisas, que sei não serem saciadas. Não costumo marcar territórios, nem tão poucos escutar a mesma música . São nos desvãos que tento passar, correr sei lá... e dizer o não dito, traçar o que nem idealizado foi. Sou do acostamento, becos e não estradas. Quero sugerir e não delimitar. Os limites empobrecem as vontades e sou consumista mesmo...
  Entre frestas e nesgas, traduzo meus recados e inundo meus hemisférios. Gosto de dizer quando há o silêncio, quando palavras cansaram de ser gotejadas. Às vezes, cuspí-las é necessário. Não suporto ouvir os mesmos vocabulários e as reticências não denunciadas.
Sou oscilante e variável. Não tenho a solução, mas costumo criar muitas perguntas. É chato não ter incertezas, é entediante não mergulhar. E nisso estou em me especializando. Gosto de sentar no chão. Cadeiras e sofás me deixam confortável demais. E, no desconforto, lanço-me centenas de vezes, todos os dias.

Sou desajeitada, não caibo em muitas roupas, em modas e em muitas gentes. Mas, me intensifico com outras, com olhares que se espalham. Gosto de visitar muitas casas, de ter mais endereços e aproximar-me, embora me afaste com frequência. Gosto de andar na contramão, entre lacunas e arames farpados, entre o que não considero e o que considero improvável.
* Texto publicado na Revista Cachoeiro Cult- ano IX- N°49- Dezembro de 2014.
Entre cinzas e cores

Sabe quando você se vê pensando em situações que não te trouxeram arco-íris nem foram capazes de perfumar seu jardim? Pois é, neste fim de ciclo, de ano, me desenhei neste contexto, tentando não deixar que ilusões esquecidas do lado de fora da casa ou pacotes que já despachei para o lixo pudessem me trazer qualquer cheiro ruim  ou  fossem colocados novamente em minha varanda por algum desavisado,pois, de propósito, tinha deixado escapar para à frente da casa.
Nos últimos dias, estou discursando, sob a ótica de Clarice Lispector e Hilda Hilst, encontrando-me taciturna, noturna, nebulosa demais. Mas, costumo, neste espaço ermo, dá uma reviravolta e ressignificar meu papel na existência. E sei que o caro leitor tem essas passagens também, talvez não na mesma dosagem, nem na mesma cor, porém, sei que é comum aos seres se reverem de vez em quando.
Pensei subidas onde não havia rastros  ( Hilda Hilst- Dos Desejos). É assim que me significo muitas vezes, em uma tentativa de reinventar esperanças e estratégias de alegrias. Se o sujeito não considerar o que ainda não é escrito, seremos incapazes de traçar perspectivas de uma possível felicidade. O que seria de nós sem uma idealização de um tempo ameno, de uma vida com menos espinhos aparentes?
Neste tempo de construção de uma nova ordem e de arrumação de gavetas, trouxe para perto angústias e dores como forma de dissipá-las de vez, sem tempo para que raízes e cicatrizes deem sinais de uma boa vinda e queiram se aprumar. Sempre temos medos escondidos em sótãos e cômodos, sempre damos alimento para dúvidas de plenitude. E costuramos, nessa linha, uma noção fina de humanidade, de ano novo, de vida nova.
Estou tentando soltar costuras de roupas usadas e envelhecidas em meu armário. Quem sabe aproveito os panos para dar brilho nos móveis, limpar o chão. Neste momento, sei que não cabem em mim, estou com um corpo com outros contornos, valorizando partes que essas roupas escondiam ou me enfeiavam. Não desejo me perder, pois seria difícil o planejamento em tempo hábil de um novo edifício, uma nova casa.
Nossas dores, leitor, revelam, na verdade, o indivíduo que emancipamos em nós. Elas demarcam as áreas de conflito, os terrenos minados, desertos, e, o melhor, as áreas de plantação. O solo apropriado para que consigamos plantar, trazer sementes e ver o crescimento do que foi cultivado. Não quero revigorar sofrimentos nem tão pouco dar ouvidos às angústias que caminham perto de nós. Todavia, sou o que vejo no espelho, nas construções da alma, graças a tudo que me fez gargalhar e inflamar também.
Desejo ser coração batendo no mundo, como alinha minha saudosa Clarice, desviando-me , quando necessário, do que traz insensatez e tristeza. Embora, elas alimentem minha sempre vontade de ser feliz e o não desejo de vê-las tocando a campanhia de minha casa. Nem a sua, leitor.
Nesses tempos de revisitação, para que haja um novo ciclo, novas perspectivas, considero a retirada das roupas velhas do armário e dos papéis sem mais utilidade. Considero a retirada de objetos que só servem para armazenar poeiras e não causam mais o efeito decorativo desejado. Dessa forma, quero desconsiderar, como importantes, sensações e assombramentos que, por motivos diversos, habitaram meus cômodos e meu quarto por algum tempo. Sei que foram tintas e desenhos necessários para meu quadro. No momento, desintegram-se das minhas necessidades; construção de pontes que me levarão para a outra margem do rio.

“Não sei perder minha vida” ( Clarice Lispector). Esta é a sentença para que inauguremos um ano bom, com vivacidade, frescor e leveza. Não aceitemos perder nossas vidas, mesmo que situações aparentem intransponíveis e sem acesso às novas fronteiras. Desejo que vencemos as dores causadas pela existência e que sensações cobertas de cor cinza sejam uma das cores que pincele sua colorida e alegre obra de arte. Querido leitor: Não perca sua vida!

* Texto publicado no Jornal Espírito Santo de Fato- 12 de dezembro de 2014.

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Milagres Cotidianos

Vez ou outra me pego contemplando as pequenas coisas. São situações minúsculas marginalizadas pela aridez diária. Consideramos milagres, fenômenos aquilo que saltam aos nossos olhos, mas acredito no milagre que perpassa nossos olhares e nem nos damos conta. 
Somos frágeis ou altivos demais para significar pétalas ou folhas caídas, para dar sentidos inaugurais àquele sorriso sem graça, àquele toque sem querer, mas que traz carinho, àquela hora de conversas rememoráveis que nos aproximam de um passado, recente ou remoto, gostoso de costurar.
Ao retornar à poética de Manoel de Barros, até por conta de sua morte e as postagens de seus textos nas redes sociais e sites, dei-me conta, ou a perdi, de como é necessário nos determos nas coisas insignificantes, nos pedaços indeterminados, nos gestos abandonados e nas palavras inconstantes que deixamos esvaziar.
Sempre gostei de viajar nas palavras e enveredar pelos significados não determinados, sempre preferi a viagem das palavras a qualquer outra viagem, rememorando Manoel de Barros. E este visitou-as com a mais rica simplicidade, reinaugurando quintais ao invés de cidades, gente ao invés de sociedades, mundos singelos ao invés de prédios, carros e trânsitos. “ Prezo insetos mais que aviões”( O Apanhador de Desperdícios) é um verso que me visita sempre. Li este poema há muitos anos e, ora ou outra, me sobressalta, embala meus pensamentos quanto à valorização das (des) importâncias.
Determinamos ser felizes nas grandes situações, nos planos mirabolantes, porém, aprendi que meu bálsamo está na inutilidade, nas coisas simples, nos vazios não preenchidos pelas ambições mesquinhas, pelas ganâncias assassinas, pelos desejos comprados nos shoppings e à custa de muitos cortes.
Para Manoel de Barros, “poderoso “ é aquele que descobre as insignificâncias (Tratado geral das grandezas do ínfimo). E disso quero me abastar, encher minhas economias. E, assim, vencer o cansaço das coisas difíceis. Universos, de tão grandes  e finos, perecem cedo demais. Quero ter o privilégio de ser abraçada pelo Sol, rechear meu corpo no vento e ter verdades para agradecer. 
Desejo para você, meu nobre leitor, o menor dos espaços para que ali você  veja a grandiosidade da vida. Nada de se entregar demais às tarefas que te distanciam das belezas nas miudezas. Seja agradecido pelo irrelevante diário, daquele não noticiado pelos jornais, pelas revistas e televisão.
Espero que aprendamos nos desprender dos nós e gaiolas que nos sufocam, gotejam nosso ar e nossas emoções. Sejamos mais afetuosos nas palavras, com os humanos e menos precisos e consumistas de sentimentos que nos danificam, nos dão a sensação de que nunca conseguimos ter o “dever cumprido”.
Quero ter a intimidade com o indivisível, o imponderável, com os abraços não ditos, o beijo molhado e doce, a frase bendita dita . Quero ter a graciosidade do menino que solta pipa e se sente o mais feliz das gentes, dos experientes contando casos de uma juventude cheia de peripécias. Desejo a mansidão das singelezas e o turbilhão dos pequenos insetos e a habilidade de seus pousos. Não quero acordar atrasada de um tempo que corre à frente dos relógios, mas quero o desconstruído, o desenfreado e o devagarzinho. Mais que tudo, desejo ter que agradecer todos os dias pelas pequenas coisas que me aproximam mais das pessoas e de mim mesmo.


segunda-feira, 27 de outubro de 2014

A ARTE que salva

“Quem faz um poema salva um afogado”, verso de Mário Quintana, poetiza, lindamente, o grande papel da arte na formação do sujeito e na capacidade de nos impactar. Como leitora visceral e uma apreciadora das artes, não conseguiria conceber um mundo sem a presença de objetos artísticos.
O cotidiano, muitas vezes, nos torna mecânicos e ressequidos, acrescentando em nossas vivências cascas, orifícios e calos de banalidades, desesperanças e desapegos. Mas, a arte nos sugere o contrário: um novo contato com o real, uma nova forma de reinaugurar verdades.
Como não repensar aspectos do psíquico humano sem as obras do magistral surrealista Salvador Dali, como não se estranhar com os novos traçados de figuras e objetos a partir da visão cubista de Picasso, como não se indignar e ressignificar aspectos da sociedade por meio de Machado de Assis e como não ampliar questões da linguagem, do psicológico e da mundividência através de Clarice Lispector?
A arte é que amplia nossa visão de humanidade, nos retirando do senso comum. Ela nos dá a oportunidade de inventariar novos aspectos da tão “dolorida” vida humana, recriando significados de liberdade, justiça, beleza, refinamento estético. Para se livrar do caos e da danação há necessidade da arte.
As diferentes formas de concepção de arte minimizam a ausência presente no indivíduo, ampliando seu olhar para o mundo, para os homens e nos fazem comungar com as emoções, com sensações inauguradas. É a arte que redesenha o imponderável, o impossível, o desconhecido, o inconsolável. Entre percalços e escuros, ela torna-se a lâmpada dos sonhos, a responsável por incitar, assustar, incomodar, filtrar, o grito que, por tanto tempo, manteve-se emudecido e intacto em nós.
Não conseguiria resistir sem arte, sem as letras e melodias de Jobim e  Buarque, como tantos outros poetas e músicos que nos retiram do comum e nos conduzem a novos cenários, a salas e sótãos esquecidos, a dimensões até então não encontradas.  A arte proporciona o encontro, a descoberta, o impensável, e, ressignificando Cruz e Souza ( Cavador do Infinito), ela é a eterna busca do sonhos, dos insondáveis, daquilo que a realidade “crua e nua” não é capaz de nos devolver ou emoldurar.
Considero a arte a responsável pela janela quando me falta ar, quando as palavras calam, quando me sinto pesada ou dura demais. É a arte que me livra das “mortes” e me permite ressuscitar muitas vezes, costurando meus remendos e traçando novas dimensões para minha essência.
A arte nos liberta das escuridões cotidianas, resgatando-nos do abismo, dos medos, do silêncio. Ela é a reinvenção das possibilidades, aproximando-nos do que nos torna mais humanos e amenizando nosso caos. É a arte que nos permite, parafraseando Quintana, vir à tona de todos os naufrágios.









Nos Desvãos da Pós- Modernidade


Nunca se produziu tantas informações no mundo como nos últimos anos. Mas, nunca vimos uma anestesia intelectual como agora. Há uma repetição de modas e costumes, de pensamentos e discursos, costurados em tecidos baratos e desgastados.
Ao ligar a TV, damos de cara com os rostos montados, em corpos moldurados em academias e dietas, que apresentam as mesmas falas alinhadas a uma vida hedonista. São cascas de frutos nada comestíveis. Triste também saber que as músicas mais vendidas evidenciam um cenário “perigoso” e superficial demais, tratando, muitas vezes,  o amor e a mulher como mercadorias de supermercado e promoções de shopping.
Nossos jovens, possíveis leitores, preferem passar seus dias postando em redes sociais suas ideias mal alinhadas em uma língua distante do que poderia se conceber como a língua portuguesa, tão amada por Pessoa, Drummond, Lispector, Adélia e companhia. Não sou contra o “internetês”, que fique claro, mas a favor de um discurso eficiente.
Nas escolas, identificamos um desgaste intelectual. Os alunos ditam palavras, sem saber lê-las. Não reinventam discursos nem inauguram opiniões acerca de um tema, uma situação-problema tão presente em seu cotidiano. Não conseguem significar o que acabaram de “ler”, em contrapartida, repetem, com veemência, o refrão de uma música que, olhe lá, tem dois versos e uma rima  “coração com paixão”.
Quando navegam neste imensurável  mundo virtual, olhando diferentes discursos, não conseguem emitir uma opinião concreta sobre aquilo que viram; se perdem entre figuras de corpos sarados , “posts” sem coesão e coerência, que remetem a  um marasmo intelectual ou à  felicidade comprada em revista.
Nesta complexa pós- modernidade, há uma busca pelo imediatismo, pelo novo que não pode envelhecer, pela ausência de confronto, pela ausência de profundidade. As notícias disseminam-se, em milésimos de segundos, e, muitos de nós, não sabemos o que fazer com elas.
Não se consegue dialogar com as manchetes e  os artigos, nem tão pouco asfaltar essa via de acesso entre a informação e o conhecimento. Parece-me que, queira eu não estar tão certa assim, embarcamos em um navio, com um mar calmo ,embora profundo, sem estarmos certo da direção e sem sabermos utilizar os instrumentos necessários caso haja uma tempestade, uma fúria do mar.
Pensar exige confronto com o desconhecido, com o imponderável, com o que está bem mais à frente do que os olhos podem ver. É reinaugurar alicerces  e reinventar linhas de acesso, caminhos entre o que é dito e significado.
E significar, neste período de tanta banalidade, torna-se ato corajoso. Fugir da mesmice e construir olhares, pois muitos costumam ver da mesma janela, tornam-se o desafio mais prazeroso que podemos experimentar.  Uma boa música, um bom texto, um discurso com propriedade revelam faces do melhor que podemos ser “porque a vida, a vida, a vida só é possível reinventada.”*
*verso retirado do poema Reinvenção, de Cecília Meireles.


 Entre Perspectivas e Esperanças


Segundo o site Wikipédia, sociedade pode ser caracterizada como um grupo de pessoas que compartilham propósitos e costumes, dentre outros, constituindo uma comunidade. Logo, somos resultado de uma construção e interação a fim de alcançarmos o bem-estar. Diante de tantos anúncios de violência, corrupção e perversidades, temos que desenho social?
Acordamos todas as manhãs, assumimos nossos postos de trabalho, reiventamo-nos, e nos resignamos também, para que alcancemos progresso e consigamos arcar com nossas responsabilidades. Acreditamos, com o despertar do Sol, ser possível aprumar  arestas e percalços. E, neste andar, compartilhamos desejos de dias melhores.
Presenciamos, nas mídias, a degola de nossas perspectivas e de nossos anseios quando lemos ou escutamos que os preços sofreram novo  aumento, que “aquele” representante está envolvido em esquema de corrupção, que morreram milhares no trânsito ou nas disputas do tráfico por mais poderio. Vemos anunciada a decadência social, e uma melodia ecoa em nossos ouvidos que os homens se embrutecem demais.
Pego-me, continuamente, a máxima do meu querido bruxo Machado de Assis de que viver requer tirar do maior mal o maior bem. É tarefa de confronto, mas necessária à espécie humana. Não esqueçamos que somos seres vivos adaptáveis, mas nada de anestesia.
Vivemos em grupo porque nascemos sociais. Temos necessidade do outro, da sua convivência, do seu amor, embora sinta, em muitas ocasiões, um desamor agudo. O embrutecimento do homem e a falta de altruísmo nos chocam e devem ser combatidos diariamente.
Não podemos consolidar a corrupção como parte da política, a ignorância como parte da pobreza nem tão pouco o mal como parte da sociedade. É nossa grande luta:  ser sociedade. Construir bons laços, bons apegos e novos sorrisos.
A dor alheia deve nos comover, a violência nos causar repulsa, a desonestidade nos incitar mudanças. Nesses embates, que devemos nos tornar sociedade, compartilhando nossos sonhos de dias melhores   (porque eles vêm, mesmo sorrateiros, mesmo aos berros) e são os dias bons que alimentam os tempos difíceis.
Em momentos de decisão, de escolhas políticas, acordemos as esperanças, levantemos do sono o desejo de um dia novo. Todavia, não sejamos aliciados com ideologias hipócritas e discursos de acomodação. Há que se pensar, questionar com expectativas, com o “coração robusto”, pois, assim, o mal ganhará menores contornos e seremos uma sociedade mais humana.


domingo, 26 de outubro de 2014

A Felicidade do Conhecimento


Recorro sempre a um poema da “minha” Adélia Prado quando, muitas vezes, pego-me frustrada ou descrente. Ensinamento (poema) trata de algo mais puro e fino que o homem pode alimentar: o sentimento. E é isso que sempre alinhou minha história, a escolha da minha profissão. Tenho muito orgulho em ser professora, e também sei da gigantesca responsabilidade em instruir, em revelar cenários e preparar os voos.
Rubem Alves dizia que há pessoas que nos fazem voar, dando-nos vontade de ir às alturas e, nisto, vejo a figura do professor. É nele que nasce nossa vontade de plantar flores, escrever poemas, reinventar formas de felicidade, acreditar no improvável e ir acima das nuvens.  Por meio desta figura emblemática e iconoclasta que nos encorajamos a abrir janelas e aprender a voar.
Sem conhecimento, não há sociedade que resista aos confrontos, aos embates e ao caos. Somos dependentes do conhecimento para que se viabilizem a liberdade, o sonho, o desejo, o gosto por viver. E somos conduzidos a ele pelas mãos do professor, pelo olhar daquele que amplia nossa capacidade de ver, nossa capacidade de percepção.
Não desejo problematizar a realidade dura deste profissional, que são muitas. Se pintarmos os espaços de cinza, nunca veremos outras cores, e ensinar é profundamente alegre e colorido. É provocar ideias, trazer à tona emoções, é dar ao outro a beleza de ser humano, pois somos mais belos e humanos quando aprendemos.
“Educar é provocar a alegria de pensar.” E pensar nos liberta do comodismo, do condicionamento, da opressão. Pelo pensamento, inauguramos espaços e caminhos, até, então, nebulosos e opacos, e nos libertamos  do casulo. Construímos experiências que nos desenharão como sujeitos e homens por toda a vida.
E é o professor que conduz a metamorfose, fomenta o olhar para além dos olhos. É pelo seu discurso que reivindicamos um mundo de esperanças, de homens altruístas, de menos asperezas, de menos medos, de menos pobrezas ( principalmente as intelectuais) e superficialidades. Nele, construímos as pontes entre os homens e a sociedade, entre o pensar e o fazer.
Ser professor é mudar sempre a alma de casa, habitando naqueles seres que desejam também ver, além das cortinas, das fotografias, dos quintais. É tornar os discursos e as ciências mais vivos, mais significativos. Ser professor é oportunizar a aprendizagem pelo afeto, é ser a felicidade do conhecimento.
 


domingo, 28 de setembro de 2014

Dos frutos do corpo
De tempos em tempos
Frutos e folhas recolhem-se à morte.
Nascem novas folhas, fincam-se raízes.
Mas a vida tem as asperezas.
Desfrutamos de janelas e paisagens,
De muros e portas.
Novas flores anunciam primaveras
Que emoldurarão espaços de caminho e de espera.
Os frutos  podres caídos no chão enfeiam  quintais e atraem
aves e animais famintos.
Dos restos, compõem-se novas ordens.
O Sol, todos os dias, repete a sina,
De nascer e morrer.
Somos pólens, frutos apodrecidos, germinação,
Flores de estação , plantas esquecidas em varanda e
Sol nascido bem cedo.
O mundo é anunciação e sentença.
É pedaços de natureza se recompondo
Em raízes e frutos morridos.
Limpar os quintais e aguar as flores
Obrigam a continuação da humanidade.





sábado, 23 de agosto de 2014

Nos Descaminhos da Humanidade


Nunca estivemos tão sozinhos com mais de sete bilhões de pessoas no planeta. A humanidade está afundada no caos, consumindo fast food e vomitando solidão e dor. Caminhamos entre tantos, mas sofremos de depressão.
Todos os dias nos bombardeiam com notícias de calamidade e opressão...e nos embalamos nas canções de violência. Já dizia Guimarães Rosa que viver é perigoso, acho que viver está um pouco pior. Não acreditamos na fala do outro, dormimos, literalmente, com o inimigo e convivemos com as vestimentas de hipocrisia do amigo.
Banalizou-se tudo. O afeto, a amizade, a família, o amor. Estamos dirigindo em uma estrada estreita, desnivelada e à beira do abismo. Se não mantemos a direção e o equilíbrio ( sabe-se lá como) , somos engolidos e sugados pela superficialidade. Uma casca fina que cobre nossa consciência.
A danação humana está marcada nas notícias de sangue na TV, nas reportagens de corrupção e na anestesia social que se enraizou em nós. Acostumamos  ver o outro sofrer nas ruas e calçadas, nos drogados que nos assaltam e o que é pior com a nossa passividade.
Somos engolidos pelos dilemas e conflitos que moram em nós e que todos os dias buscam novos lares. Aceitamos o sofrimento como penitência ou nos dilaceramos no consumo super e mega capitalista para amenizar o mal.
A humanidade, desculpe o pessimismo, rasteja, mas não grita. Sua voz foi silenciada entre falta de tempo e de coragem. Tornamo-nos seres imprecisos e desimportantes. Não nos denunciamos nem poetizamos o outro com esperanças. Aliás, desse tecido estamos tirando linha após linha.
Vende-se a expectativa que faz parte. Faz parte nascer e morrer, mas agonizar não. Agonizamos, é verdade. Não vemos esperança , paciência e respeito brotarem, como ainda teimam as flores. Do nosso jardim , vemos somente galhos secos e ervas daninhas.
Estamos doente de humanidade. O outro é o outro, pensam muitos, não faz parte de mim. Isolamo-nos e perecemos. Recortamo-nos e não nos reinventamos. Morremos do pior jeito: ainda em vida. Deixamos de acreditar porque nos disseram que não tem mudança...uma continuidade que nos mata.
Nunca tomamos tanto remédio. Para ser feliz, ter fé, dormir e acordar. Medicamos o corpo, e a alma? Não temos comprimido para nos fazer amar e ter felicidade. Afugentamos nossas indagações com obrigações de beleza, passeios e postagens nas redes sociais.
Estas por sinal sentenciam nosso caos e desordem. Ali, desenhamos a alegria, os amigos e maximizamos as fotografias como forma de minimizar nossa tristeza tão presente. O virtual passa a conduzir nossas andanças, pensamentos toscos e banalidades. Ele , muitas vezes, ampliam nosso vazio, nossa falta de discurso , nosso profundo silêncio.
Nos emudecemos e murchamos. O homem pós-moderno calou-se. Nessa ambiência, acostumou-se a trocar sempre seus móveis e sentimentos de lugar. Acostumou-se a anestesiar sua dor com remédio, compras e facebook. Talvez, tente gritar , balbuciando baixinho para não se tornar desagradável .
O enfrentamento foi trocado pela acomodação. Políticos sempre roubam, o mundo está violento, temos que colocar grades na casa, não quero votar, ele não aprende mesmo são alguns discursos que prevalecem  em rodas de conversa e no pé do sofá. Somos individualistas porque se tornou mais fácil ....para evitar o sofrimento, para não se iludir, para não chorar. A falta de sensibilidade nos dá conforto, nos livra, por algum momento, da dor, porém, coloca-nos cada vez mais superficiais e baratos. E eu, sim, acredito ainda, que o sujeito, indivíduo, cidadão, humano é tão caro, tão valioso.







terça-feira, 3 de junho de 2014


José
E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?
Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?
E agora, José?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora?
Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?
Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!
Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José!
José, para onde?

Carlos Drummond de Andrade

Senha

Eu sou uma mulher sem nenhum mel

eu não tenho um colírio nem um chá


tento a rosa de seda sobre o muro


minha raiz comendo esterco e chão.


Quero a macia flor desabrochada


irado polvo cego é meu carinho.


Eu quero ser chamada rosa e flor


Eu vou gerar um cacto sem espinho. 


Adélia Prado





Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
-- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.


Adélia Prado


sábado, 31 de maio de 2014


Do amor
Deu saudades do amor.
Embora minhas mãos trêmulas,
meu braço dolorido,
minha manhã cinza.
Quis cantar canção...
Trazer dourado para meu quarto.
Mas, sinto-me próxima do outro caminho.
Sinto desconforto,
mas bateu esperança.
Tenho insistência,
mesmo que meu desenho trace só rabiscos.
Sinto falta,
Não quero ausências,
mesmo que suas canções
se aproximem de meus ouvidos.
Sonho tardes alaranjadas e desejos bem verdes.
Tenho vontade de alimento doce, que dissipe minha fome.
Quero chuva que traga flores
E sol que me acorde cedo,
invada  meu espaço e me traga para janela.
Amor.
Quis sempre perto .
Invento ser feliz todo dia,
com café, geleia e beijo.
Sonho desavisada.
Sem anunciar desejos e sensações.
Acordo, por vezes, cansada.
E durmo com gritos do mundo.
Me sinto universo demais
 para ocupar um único corpo.
Quero ser protegida,
mesmo gostando de voar.
Arquiteto coisas extrapolantes,
Mas gosto mesmo de palavras
que  estão ao meu lado.
Sou cotidiana, sem perder o inesperado.
Amor, para mim, é rotina com beijos roubados.
É certeza com todas as dúvidas.
Sinto muita saudade
Emoções que , por vezes, desconheço e não percebo,
mas quero!
Solidão é bom para escrever...não para caminhar.
E aproveito da escrita para me realinhar.
Registrar com paixão como o amor me humaniza.
Ele me traz pra perto de Deus, de sua beleza.
Não quero dar com a cara no muro.
Nem tão pouco trancar minha casa
e esperar as contas chegarem.
Quero amor, de carne e alma.
Amor que me acalma e me cansa.
Daí, dorme-se para revigorar.
Dorme-se junto,
sela-se o trato.
É...amor é trato ...
Documento assinado de paz, desordem,
Lealdade e gargalhadas.
Do amor, quero sentir saudades,
Receio, medo...
E ter pele também.
Quero amor todo dia,
Embora , às vezes, só apareça nos fins de semana
Quiçá os feriados...
É desse amor que me reinvento.
Me alimento.
Me anuncio.
E permeio meu discurso.
Quero amor feio e bonito.
Amor de festa e de ressaca.
Amor tranquilo, mas que traga barulho.
É dele que sinto saudades....








terça-feira, 27 de maio de 2014

Em Tempo
Eram três horas. Alice sentia-se atrasada. Era comum ter dificuldades com o tempo, apesar de colecionar vários relógios. O último recebido tinha guardado ali, em sua cabeceira, como prova de que era lembrada. O tempo  lhe inflamava, às vezes, mistérios e sentenças.
Em sua aula de filosofia, tinha lido que o tempo é a marca da humanidade, somos construídos sob ele e não há como fugir.”É um conceito percebido pela vivência, parte de nossa percepção mental”. Ao ler isso, se convenceu que sempre viveu à espera, sempre delegou aos outros sua tarefa de sobrevivência.
Os relógios, objetos de coleção, foram tentativas de se agarrar ao tempo, costurando elementos de seu antes  com as considerações de seu porvir. Nada está sentenciado, mas suas vivências até então nunca tinham lhe causado tamanho desassossego e indagações, que estavam  escritas em seu espelho mesmo sem perceber. Que danação!
Como forma de se apropriar de algo, que nunca tinha conseguido, recorreu à caixa de relógios e alguns escritos empoeirados que se depositavam na cômoda rotineiramente aberta, nem que seja uma fresta...e de espaços minúsculos ela gostava.
Com a caixa em mãos, refez a trajetória de cada relógio que comprou; aqueles de liquidação até os ganhados em datas importantes, pois todos sabiam de seu gosto esquisito por essas peças. Contemplou cada um e começou a se lançar perguntas, coisas que não era costume.
Recorreu a seu livro antigo e arregalou bem os olhos quando leu que, segundo Kant, não há realidade de tempo. “O tempo é uma noção a priori que não designa nada além de determinada característica do nosso modo humano de receber informações através dos sentidos.”
Nesse momento, percebeu que seu tempo era uma invenção de sua mente anestesiada. Passou a indagar que nada era real, os relógios apenas se apropriavam da organização. O que fazer de si agora? Não estava ainda acostumada com essas reclamações internas, nem tão pouco dar vivência a esse tipo de leitura. Tudo pra ela sempre se concebeu chato, mas acreditava ser o tempo o limite entre a realidade e os seus desejos.
Costumava receber verdades alheias, e tomá-las aos goles, mantendo-as como certas até que outros falassem. Mas agora estava sem o visgo que a mantinha na realidade, sem o alimento que a nutria. Esse escape não era esperado por sua personalidade. Questões que a atiravam em um momento desconhecido. E os seus relógios... o que fazer com eles. Isso pairava, neste instante, em suas concepções. Tentava guardar sua noção de tempo, que escorria, neste presente, pelo ralo de seu banheiro.
Sem realidade palpável, num corpo esguio, como sobreviver neste caos. O tempo, pensava, não segue escala cronológica nem define meu momento de comer. Ah...agora sentia uma fome descomedida, uma necessidade que consumia muito mais que suas vísceras, corroía seu espírito.Era seu momento epifânico.Em êxtase, passou a olhar.

Alice guardou sua coleção. Não esqueceu de fechar a gaveta. Passou a visitar cômodos esquecidos. Limpou seu espelho. Inaugurou ordens e passou a se alimentar, uma fome que não conseguiu saciar.Com o passar do tempo, aprendeu a mexer nos ponteiros dos relógios e resolveu dar de presente o relógio de cabeceira.  

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Nascido do barro e do oco
Eis um ser barroco
Do caos e da ordem
De orifícios e lacunas
De sandices e sermões
De espírito e corpo
Um corpo que dói e goteja
inundado da dor de nascer
Morrer não é sentença.
Nascer não é recompensa.
E a vida grita...
Entre simulacros e dissimulações
Entre barbáries e  ideologias
Entre mitos e novidades
Unívoco e plural
De raiz e folhagem
De subúrbio e passagem
 Do antes e da pós- modernidade
Entre durezas e linhagem
O indivíduo
refeito do antes e do inesperado
promovido do acaso e do criado
desenho do imundo e do desejado
O ser  barroco
Inventado do barro e do oco






terça-feira, 20 de maio de 2014

Você quer?
Estamos sempre perambulando pelas escolhas. Das fáceis às difíceis...das fatídicas às perenes.
Com o poder das escolhas, construímos pontes, sentenciamos ausências e trazemos pra perto. Desconstruímos linhas do tempo e alinhavamos nossos sonhos. Escolher não é uma ordem, é indispensável. Mas, temos a sensação que , muitas vezes, desmoronamos em meio a elas. O chão forte, bem cimentado,  no qual achamos estar firme, se consome...pairamos, agora, no ar, no que restou do equilíbrio.
A escolha nos faz algozes de nós mesmos, mas precursores de muitas coisas. Ela nos alimenta e delimita nossa capacidade. Somos frutos de muitas escolhas...podemos ser novas árvores também.
Lembro desde criança que escolher para mim sempre foi meu caos, a sensação que me causava mais “pânico”, mas aqui estou por conta das minhas escolhas. Encontro-me castigada e especial por poder fazê-las.
Escolhemos ser felizes, escolhemos a conta bancária e o mais belo jardim em nossas casas?  Escolhemos ser quem nos tornamos, escolhemos a rua da vida que nos enveredamos? Tantas escolhas...e a do amor então...como é bom nos embebedar pelos abraços e beijos molhados... pelos versos amorosos e sentenças de carinhos.
O amor é uma escolha. Qualquer que seja ele. Uma escolha da humanidade em construir novas “leis” e novos valores. Uma escolha de sobrevivência. Escolher  é inerente à vida...nossa forma de desacampar momentos, reinaugurar olhares e desenhar novas ideias.
Deus, em sua infinita sabedoria, deu-nos escolhas, sabendo que somos responsáveis por elas. Ser humano requer escolher entre o vertente e o imponderável; o presente e a ausência, entre a denúncia e o silêncio.
Nesse diálogo, cá estamos nós. Somos o resultado de uma soma exata ou com números a dever. Somos a danação e a melodia perfeita. A prosa convertida em poesia. Somos o estrangeiro e o local. Nessas bifurcações e dilemas, vivemos pelas escolhas, nas e para elas. É delas que construímos nosso discurso, vivemos frustrações e criamos o medo ou a coragem. Mas, em meio a tudo, a escolha é um presente, às vezes mal embrulhado, que vale à pena ganhar....vou abrir meu pacote.


sábado, 17 de maio de 2014




O Mundo É Um Moinho-Cartola



Ainda é cedo amor
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora da partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar
Preste atenção querida
Embora saiba que estás resolvida
Em cada esquina cai um pouco a tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és
Ouça-me bem amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões à pó.
Preste atenção querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás a beira do abismo
Abismo que cavastes com teus pés