A ARTE
que salva
“Quem faz um poema salva um
afogado”, verso de Mário Quintana, poetiza, lindamente, o grande papel da arte
na formação do sujeito e na capacidade de nos impactar. Como leitora visceral e
uma apreciadora das artes, não conseguiria conceber um mundo sem a presença de
objetos artísticos.
O cotidiano, muitas vezes, nos
torna mecânicos e ressequidos, acrescentando em nossas vivências cascas,
orifícios e calos de banalidades, desesperanças e desapegos. Mas, a arte nos
sugere o contrário: um novo contato com o real, uma nova forma de reinaugurar
verdades.
Como não repensar aspectos do
psíquico humano sem as obras do magistral surrealista Salvador Dali, como não
se estranhar com os novos traçados de figuras e objetos a partir da visão
cubista de Picasso, como não se indignar e ressignificar aspectos da sociedade
por meio de Machado de Assis e como não ampliar questões da linguagem, do
psicológico e da mundividência através de Clarice Lispector?
A arte é que amplia nossa visão
de humanidade, nos retirando do senso comum. Ela nos dá a oportunidade de
inventariar novos aspectos da tão “dolorida” vida humana, recriando
significados de liberdade, justiça, beleza, refinamento estético. Para se
livrar do caos e da danação há necessidade da arte.
As diferentes formas de concepção
de arte minimizam a ausência presente no indivíduo, ampliando seu olhar para o
mundo, para os homens e nos fazem comungar com as emoções, com sensações
inauguradas. É a arte que redesenha o imponderável, o impossível, o desconhecido,
o inconsolável. Entre percalços e escuros, ela torna-se a lâmpada dos sonhos, a
responsável por incitar, assustar, incomodar, filtrar, o grito que, por tanto
tempo, manteve-se emudecido e intacto em nós.
Não conseguiria resistir sem
arte, sem as letras e melodias de Jobim e Buarque, como tantos outros poetas e músicos
que nos retiram do comum e nos conduzem a novos cenários, a salas e sótãos
esquecidos, a dimensões até então não encontradas. A arte proporciona o encontro, a descoberta,
o impensável, e, ressignificando Cruz e Souza ( Cavador do Infinito), ela é a
eterna busca do sonhos, dos insondáveis, daquilo que a realidade “crua e nua”
não é capaz de nos devolver ou emoldurar.
Considero a arte a responsável
pela janela quando me falta ar, quando as palavras calam, quando me sinto pesada
ou dura demais. É a arte que me livra das “mortes” e me permite ressuscitar
muitas vezes, costurando meus remendos e traçando novas dimensões para minha
essência.
A arte nos liberta das escuridões
cotidianas, resgatando-nos do abismo, dos medos, do silêncio. Ela é a
reinvenção das possibilidades, aproximando-nos do que nos torna mais humanos e amenizando
nosso caos. É a arte que nos permite, parafraseando Quintana, vir à tona de
todos os naufrágios.
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