Nas
pedras e roseiras
Nestes últimos meses,
viver tem se mostrado uma façanha pra lá de incrível. Vemos que os
aumentos ( dos preços) dos serviços e produtos tornaram-se um
agravante para que desanimássemos um pouco sobre o presente e
futuro. Ainda, vemos um ser humano cada vez menos ser humano, dotado
de sentimentos negativos e uma competição desenfreada para que
alcance poder, dinheiro e status a qualquer preço. Sim. O quadro
apresenta-se difícil, porém, costumamos dar, sempre, à volta por
cima e fazer de um limão uma gostosa limonada.
Viver é precioso demais.
Somos o melhor presente da vida. Peça única, que nunca deve ter
liquidação. Mesmo diante de dilemas corrosivos, que cortam a carne
e a alma, somos capazes de cicatrizar e, mesmo com a marca, seguir
radiantes e mais belos ainda. Já dizia Rubem Alves que “ostra
feliz não faz pérola”, já que para criação da pérola é
necessário ter um ser estranho dentro de si( ostra) , sendo tal
“joia” uma reação natural contra invasores. Logo, tal beleza,
de valor altíssimo, surge de um processo dolorido.
Não é diferente de nós.
Só atingimos crescimento e nos tornamos menos fracos à medida que
sofremos os embates. Quando somos postos à prova e temos que reagir
na tentativa de soluções e mudanças. É, neste momento, que vemos
o quanto somos capazes e sensíveis a uma postura diferente,
modificando nossas ideias e atitudes. Ninguém é feliz na dor, mas
ninguém cresce em um jardim florido e perfumado. Já disse, em um
dos meus textos, que somos criados nos contrastes; sabemos definir e
querer o bem porque alguém já nos fez muito mal, gostamos do calor
porque os frios doeram os ossos.
Cora Coralina poetiza que
a vida tem duas faces: positiva e negativa, sendo lutas e pedras
lições para que saibamos viver. Logo, rasgar as costas nas paredes
da vida e furar dedos em espinhos nos fazem mais sábios e melhores.
O sangramento, as agonias e os caos que selarão nossos modos de
olhar e compreender a existência.
Se a janela não se abriu
hoje, abrimos portas, quebramos paredes e vemos de orifícios e de
grandes buracos o Sol e a chuva que sempre se aproximam. Se nada
funciona da forma que sonhamos, conversemos mais com Deus, leiamos
muito mais poesia e ouçamos aquelas canções que nos arrepiam, nos
fazem fugir um pouco das rudezas diárias. Mas, viver é
indispensável!
Sorrir é maravilhoso.
Chorar lubrifica a alma. Dançar aquece e aproxima o corpo do outro e
de você mesmo. Trazer lembranças lindas, de viagens, de festas, de
um momento único, traz flores para um jardim, às vezes, esquecido.
Abraçar é estar junto e se doar. O beijo sempre inebria. O elogio
reinventa possibilidades. O toque nos amacia. Valorizar quem está
com você é uma forma de dignificar parte de nós. Mesmo que haja
crises, cortes, falas de desesperanças, não se ofusque, nem turve
sua vida com canalhices de gente sem cor e flores na alma. Faça como
Cora, “ recrie tua vida sempre, sempre. Remove pedras e planta
roseiras e faz doces. Recomeça.”
* Texto publicado no Jornal Espírito Santo de Fato
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