Não
dividia nada com ninguém. Como dividir o homem que desejava todos os
dias com as mais indecentes das mulheres. Não poderia dividir seus
pensamentos mais sórdidos com a amiga de trabalho. O que se teceria
sobre ela? Como encararia o amigo da repartição depois de
socializar seus mais tórridos segredos?
Sim,
ela tinha a avareza impregnada na alma. Entre as frestas escapadas de
seu corpo, entre os orifícios escapados de sua mente poderiam se
revelar suas insanidades, seus devaneios tão precisos, seu espírito
de posse, sua visão unilateral, sua não-vontade de dividir comida,
dinheiro e sonhos. Seus sonhos eram preciosidades demais para dividir
com o outro.
No
amor, não aceitava devolução nem compartilhamento. Aquele que a
queria e ela o mesmo era mantido, dentro de si, em clausura. Mas,
insinuava para que o outro se mantivesse sob esta linha, pousasse seu
raciocínio e coração nesta ideia. Nada de soltar pernas e olhares
na rua e desse de escapar sorrisos para as belas raparigas. Nada de
fugir de seu olhar contemplativo por alguns segundos. O que era dela
era costurado em si.
Sua
avareza a perseguia em suas andanças pelo seu mundo interior e dos
outros em que insistia morar. Cabia tão pouco de si no homem que
idealizou de seu, de sua propriedade sem escritura. Era de trejeito
ignóbil, mas era provocativo nas palavras lançadas a figuras de seu
interesse, conseguia alinhar desejo a certa simpatia. Ela não
ignorava o que se podia denominar talento nato.
Assim,
ela carecia de ser avarenta, egoísta, mesquinha. E era na sua
mesquinhez que o dito amor sobrevivia. Faltava, mas ela supria os
vazios na posse, na sempre tentativa de mantê-lo mais próximo
possível, nos entornos dos seus dias. Ele era a sua falta de escape,
a sua falta de tolerância, a brutalidade que sobrevivia nos seus
sentidos.
Nada
de desmanchar ou equacionar a liberdade no amor ou na vida que dá um
jeito de sempre seguir. Não lhe permitia as mãos e os pés soltos,
coração abastado a não ser que fosse com ela, somente com ela,
para todo sempre com ela. Carcomia-se por todos os lados, soletrava
as certezas mais improváveis e desafiava o direito de ir e vir de
todos os mortais.
Sua
avareza era sua forma de não se desgrudar da vida, de não se
desintegrar diante de tantos caos e violências que imperam no
cotidiano. A posse de seu homem, de seu tempo, seus escombros e
desejos a permitiam acreditar que o amor é a grande danação, que
dá para visitar todos nós. Um dia qualquer, ele costuma bater a
porta e, caso não atenda, costuma pular a janela.
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