Não
importa o que fizeram com você. O que importa é o que você faz com aquilo que
fizeram com você.
Tenho me assustado com o número de pessoas que vivem à base de
antidepressivos. São indivíduos que precisam tomar medicamentos para dormir,
para acordar, para estar bem, enfim, evitar o sofrimento, tão real na vida. Isso
acaba, sem sombra de dúvida, por anestesiar o sujeito de si mesmo.
Por outro lado, nunca se vendeu tanta
“felicidade” em posts em instagram e facebook, como se os seres humanos fossem
obrigados, a qualquer custo e mesmo que, superficialmente, estar feliz e negar
qualquer forma de infelicidade. Não há nada mais terrível.
Há uma busca desenfreada pelo amparo, mesmo
sabendo que estar vivo já nos coloca em situações de total desencontro. Viver
requer de nós embates diários com os diferentes dilemas que nos circundam e,
mais que isso, requer que saibamos conviver com os fracassos, pois eles sempre
virão.
Não há uma felicidade linear, visto que
somos seres oscilantes e que se modificam a todo o momento. Significar-se como
um ser que “precisa” a todo instante estar feliz fará com que fiquemos
frustrados e tomados, muitas vezes, de prostração e uma densa tristeza. O
consumo, as viagens, as festas de fim de semana, o corpo milimetricamente
esculpido não farão de você alguém mais completo e pleno.
A felicidade, algo tão subjetivo, é
construída de momentos alegres, como projetos realizados, família unida,
valorizações, relacionamentos, etc, que nos dão conforto e possibilitam ter
perspectivas e sentidos para o que nos propomos fazer. Não viver as perdas-
luto (passamos por tantos na vida) nos fazem seres que precisarão de muletas para
continuar existindo, pois não significamos o papel da dor no processo de nossa reconstrução.
A dor é a oportunidade de crescimento, de estabelecimento de coragem e de vida,
fomentando algo indispensável a nós: resiliência.
Neste aspecto, o mundo contemporâneo tem exigido dos indivíduos
uma postura muito mais artificial, alimentando uma vaga noção de felicidade ao
poder de compra, à fama, beleza e ao status.
O sujeito é reificado, colocado como produto, algo manipulável e
superficial, logo, não ir ao encontro dessa realidade nos fazem destoantes do
discurso maniqueísta.
Muitos, desta forma, incorporam uma
intolerância à frustração e às tristezas, o que o transforma em um ser cada vez
mais doente. Dado o imediatismo, vemos tantos recorrerem ao que poderá
amortizar ou adormecer tais insatisfações, mas, o caos permanece ali se não
ressignificado.
Nunca estivemos em uma sociedade tão
narcisista e hedonista, sem um olhar mais particular para o outro. E essa busca
tão desenfreada pelo prazer e felicidade a qualquer preço em detrimento de
qualquer outra coisa nos empurra ainda mais para um abismo cada vez mais
profundo. Deixamos de ser o sujeito para ganhar ares de objeto, deixamos de ter
a poesia gerada também na angústia para desfrutarmos de leituras vazias e de “pseudo-ajuda”,
deixamos de conclamar nossos cenários, dotados de caos e possibilidades, para
rechear nossas salas de estar com objetos de decoração.
A felicidade é sempre possível, mas, se
nego que serei infeliz tantas vezes, deixo de ser mais humano. Os caos e os confrontos são parte
das cascas e calos que marcam e individualizam nossa história, tornando-nos
muito mais especiais. Sem caos e embates, não produzirei a minha pérola,
parafraseando meu saudoso Rubem Alves.
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