domingo, 10 de setembro de 2017

Decomposição


Ainda acredito na vida desenfreada, sem prestação de tempos e de acordos com alto preço. Sou dada ao avesso e, por isso, considero novas datas e horas para a alegria em compassos de samba e bossa nova, com brisa que teima aparecer e arrepiar minha pele sobressaltada. Ainda acredito que marés anunciam luas e períodos de frio, que meus pés encharcados embalsam minha alma tantas vezes atordoada que se encoraja toda vez que a manhã se anuncia.
Sei que meu moço- ainda acredito- trará os melhores ventos e encharcará meus olhos com os irrecusáveis perfumes, com a felicidade traçada no cotidiano, com as mãos que se esbarram e procuram os corpos. O abraço convertido em noites sem pressa e muito maiores do que descritas naqueles poemas de verão.
Sou crente de amor real, de amores que desembocam de livros e se anunciam, rastreiam meu jeito, minhas nuances e meu cheiro e simplificam boa parte dos meus cenários elaborados minuciosamente, sem qualquer pretensão.
Acredito no conforto do outro, embora eu seja desconfortável, dado em meio às minhas crises de sangue, de espírito moribundo, de desordem existencial cravada em devaneios. Tenho fé que este amor tratará meus subterfúgios, emergirá nos meus mais infundados momentos e será bálsamo nas feridas que se recusam criar cascas.
Assumo que minha pretensa coragem vem de minha poesia brejeira e sem título, que me seca e encharca.. Da poesia que não recusa os dias insuportáveis nem o princípio da realidade, que se inebria na beira do abismo mesmo correndo os riscos.
Acredito que a vida não se suporta sem as instabilidades e confrontos. E eu não nego que minha existência arredia, solitária e sempre poética seja plenamente possível, seja a crença instituída ou plástica.
Eu sou apenas o gozo que se deseja, a poesia tolerável e sem capas, a moça dos dias mais solares e mais soturnos, a mulher que não se aborta e reverencia o seu melhor amor com todas as flores, semiótica e força, com toda a preciosidade , sol, lua, com todos os universos e os minúsculos. Sim, eu acredito. Simone Lacerda


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