Haja vista
Ver te
impressionava, ainda mais, em terra que ninguém conseguia ver além
do nariz. Todos tinham uma visão muito casual, quase imperceptível.
E, ali, João das Rosas almejava elementos fora do alcance do senso e
dos olhares comuns.
Conseguia
identificar gente hipócrita de longe, aquelas que tentam, com tecido
fino e caro, esconder mau caráter, tolerar sentimentos ruins
habitando sua alma por um troco qualquer. João tinha visão
privilegiada, mais que qualquer indivíduo, mais que qualquer mortal.
Habitava em ambiente
onde não havia olhares poéticos, políticos, filosóficos nem tão
pouco sociais. As pessoas eram conformadas em ver pelas gretas,
pelos orifícios, recortes mínimos, que mal se podiam detectar
cores, figuras inteiras e em diferentes dimensões. Perceber, então,
pelo olhar, o sentimento depositado, no espírito e na mente, era
impensável. Aliás, duvido muito, que pessoas daquele lugar
conseguiam desenvolver com eficiência tal ação. Era demais. E elas
de menos.
Tudo era aceitável,
nada as inflamava. Explosão, indagação, incêndio na alma era
abominável. Não sabiam que ver, olhar eram tão essenciais como
ferramentas indispensáveis da existência. O mundo, sob essas
condições, era acinzentado, com rabiscos, sem traçados delineados.
As pessoas também, para os que não viam, não eram notórias nem
tão pouco singularidades. Tudo passava, sem, por um ínfimo momento,
tivesse um olhar com clareza, com gosto, melodia, expansão, beleza.
A beleza nem era
relativizada. Nem aclamada, questionada, inventada. Sim. Acredito!
Estavam todos, menos João, anestesiados, sem grandes universos, sem
contemplação, perspectivas, vertentes. Um cenário adorável para
os manipuladores, mentirosos, ardilosos. Mas, a esperança brotava
devagar em João.
Ele via poesia na
esquina, nas expressões mais sorrateiras, nas palavras quase-nunca
proferidas, nos descompassos do cotidiano, nas beiradas e nos
descentros. Olhava com exatidão e serenidade os homens, teimando
acreditar que seria possível, um dia, a visão de todos. Sonhava e
alimentava que, em algum tempo, haveria possibilidade de todos os
seres olharem.
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